|
A reforma tributária do consumo, com a criação do IBS e da CBS e a adoção de uma não-cumulatividade mais ampla, vai muito além da simplificação de tributos. Ela muda a lógica dos contratos no Brasil. Hoje, nosso sistema obriga arranjos contratuais distorcidos para reduzir carga fiscal. A partir de 2026, essa realidade muda: preço, custo, pagamento e crédito passam a se relacionar de outra forma.
As empresas terão que rever contratos, já que o aproveitamento de créditos dependerá do efetivo pagamento do fornecedor. Isso exige ajustes na matriz de risco e nas regras de governança, principalmente em operações com plataformas e intermediários. Como a transição vai até 2033, os contratos de longo prazo precisam prever regras claras sobre impactos tributários ao longo dos anos.
Na prática, a reforma exige atenção em três pontos: (i) modelo de negócios, (ii) repasse de impactos tributários no preço e (iii) adaptação às obrigações de split payment e vinculação dos créditos ao pagamento.
Novos modelos de negócios
A maior mudança vem da ampliação da não-cumulatividade. Os créditos passam a ter natureza financeira, eliminando a distorção que desincentivava operações com múltiplos fornecedores. Assim, a decisão entre produzir internamente ou terceirizar fica mais neutra. Isso abre espaço para especialização, uso de BPOs, facilities, manufatura sob encomenda e plataformas.
Mas há riscos. Quanto mais pulverizada a cadeia, maior a chance de problemas de integração, falhas de informação ou conflitos perante o consumidor. Por isso, será essencial definir responsabilidades de cada elo já na proposta comercial e reforçar cláusulas sobre regressos, indenizações e fluxo de pagamento.
Preço nominal x custo efetivo
Durante a transição (2026 a 2033), o preço pode subir sem que o custo líquido aumente, já que o cliente poderá recuperar créditos. Isso exige cláusulas de neutralidade tributária, com metodologia clara para calcular o que é realmente custo final. Fórmulas genéricas deixam de funcionar; será necessário prever mecanismos de ajuste automático diante de mudanças de alíquota, split payment ou alteração no cronograma de extinção de tributos.
Além disso, a alocação de riscos precisa ficar clara: erros fiscais do fornecedor não podem ser transferidos ao cliente; já limitações próprias do adquirente (como regime impeditivo de crédito) não devem recair sobre o fornecedor.
O split payment
O split payment vai ligar diretamente a nota fiscal, o pagamento e o recolhimento do tributo. Isso exige adaptação tecnológica e contratual: as partes devem se comprometer a manter sistemas compatíveis, definir quem recolhe quando o meio de pagamento não segregar automaticamente, e prever regras para estornos, devoluções e diferenças de valores.
Mesmo com intermediários, a responsabilidade legal continua sendo do contribuinte, por isso os contratos precisam deixar claro quem responde por falhas e como será feito o ajuste financeiro em cada situação.
Preparando os contratos
A reforma cria oportunidades de remodelar negócios e rever preços, mas exige contratos mais sofisticados. É hora de incluir cláusulas de neutralidade tributária, mecanismos de reequilíbrio, regras para split payment e definição clara de responsabilidades.
Empresas que começarem agora essa adaptação terão mais tranquilidade para atravessar os anos de transição.
|